O teste de aglutinação em salina é uma técnica simples que pode contribuir para orientar o médico veterinário ao diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada (AHIM) em cães e gatos.
Devido à simplicidade da técnica que consiste na mistura do sangue do animal com solução diluente – fisiológica ou PBS, promove que muitos profissionais se aventurem a realizá-la, sendo relacionados ou não à medicina laboratorial.
Por um lado é bom disseminar a técnica devido ao seu valor diagnóstico, por outro, é importante ressaltar que há condições determinantes de qualidade na realização da técnica e que impactam diretamente na interpretação do resultado e que podem gerar muitos equívocos. Diferentes diluições são utilizadas para a técnica de aglutinação em salina na rotina laboratorial veterinária, e de acordo com a diluição escolhida podem ocorrer frequentemente falsos positivos, e assim gerar confusão no diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos. Um erro na interpretação do resultado gera consequentemente erro na conduta dos pacientes.
Acurácia diagnóstica das diferentes diluições utilizadas na rotina laboratorial
Considerando que a diluição é a mistura de partes de sangue em partes de solução diluente, um trabalho publicado no Journal Veterinary Internal Medicine avaliou diferentes diluições e suas respectivas sensibilidades e especificidades comparando com o teste de Coombs, a técnica padrão ouro para o diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos.
Nesse comparativo entre as diferentes proporções (sangue : solução diluente) chegaram nas seguintes condições: a proporção de 1:1 teve sensibilidade de 88% e especificidade de 29%; a proporção 1:4 apresentou a sensibilidade também de 88% com especificidade de 49%; houve redução da sensibilidade para 67% na proporção de 1:9 e com especificidade de 70%; e na proporção de 1:49 manteve a sensibilidade de 67% com aumento expressivo na especificidade para 97%. Uma maior quantidade de falsos-positivos foram encontrados na proporção de 1:1 quando comparada com as demais diluições citadas. Assim, concluiu-se que quanto maior a diluição, maior a sua especificidade e consequentemente acurácia diagnóstica, porém menor a sua sensibilidade para o diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos.
Para entendermos o que isso significa para a aglutinação em salina como ferramenta diagnóstica de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos, precisamos compreender de que a acurácia diagnóstica se trata da capacidade do teste em discriminar condições patológicas de condições saudáveis, e a sensibilidade e especificidade de um teste são parâmetros que complementam e contribuem para essa avaliação.
A sensibilidade de um teste é sua capacidade de dar um resultado positivo, ou seja, é definida pela probabilidade de detectar o agente alvo em um paciente com a doença em si. Já a especificidade, é definida pela capacidade de dar resultados negativos em pacientes que não apresentam a doença, assim é capaz de garantir de que quando um resultado é positivo, seja realmente positivo. Assim, testes sensíveis são excelentes para a triagem de uma enfermidade porque permitem mais facilmente os resultados positivos, e já os testes específicos são mais usados como confirmatórios de doenças.
Escolha da diluição para a aglutinação em salina
O que pode haver de problemática diante da sensibilidade e especificidade é que quanto mais sensível é o teste, mais possível de gerar resultados falsos positivos. E quanto mais específico o teste é, mais possível é dele gerar resultados falsos negativos. E é por isso que o teste ideal é aquele que além de ter alta sensibilidade, também tem alta especificidade, pois combina o melhor dos dois índices.
Desse modo, é isso que precisamos avaliar aqui quando dizemos de qual diluição usar no teste de aglutinação em salina como ferramenta para o diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos. Pois, o que se concluiu com esses dados comparativos de diluições de aglutinação em salina é que pode-se obter uma alta especificidade para o diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos quando o teste é realizado na proporção de 1:49 e já que os falsos-positivos são incomuns nessa proporção, evita que pacientes anêmicos sem o envolvimento do sistema imunológico anti-eritrocitário receba um diagnóstico equivocado.
Adicionalmente, no caso de o teste de aglutinação em salina nessa proporção de 1:49 der positivo, é então sugestivo de anemia hemolítica imunomediada quando associados a outros sinais clínicos consistentes com o diagnóstico. No caso de resultados negativos nessa diluição e que a evidência de hemólise está presente e ainda há a suspeita do componente imunomediado sugere-se prosseguir com outros teste de investigação de presença de anticorpos anti-eritrócitos como é o teste de Coombs, uma vez que a sensibilidade dessa diluição é limitada.
Aplicação da aglutinação em salina no diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos
Fazer uso da aglutinação em salina para o diagnóstico de anemia hemolítica imunomediada em cães e gatos é simples e acessível, no entanto, exige uma técnica adequada para consequentemente uma interpretação correta do seu resultado. E quando falamos de diagnóstico, não podemos dizer que podemos fazer de qualquer maneira, pois há sempre uma maneira mais qualificada de se fazer, e penso eu, que é essa que devemos buscar.
Nesse sentido, apesar de não haver uma diluição ainda estabelecida como padrão ouro, podemos utilizar de combinações delas em nossa rotina laboratorial, sempre acompanhada de clareza de informação e boa descrição no laudo de resultados, incluindo os dados de sensibilidade e especificidade dos testes utilizados de suas diluições.
Vale ressaltar ainda que há outras formas de preparo da aglutinação em salina que não foram comparadas aqui, como é o caso do uso de hemácias lavadas para a sua realização. Condição essa que também apresenta alta especificidade.
Que o teste de aglutinação em salina seja amplamente utilizado e que receba o devido cuidado para ser realizado e interpretado.
Referências utilizadas:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/30806491/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33169867/
https://www.vet.cornell.edu/animal-health-diagnostic-center/testing/protocols/immunology/direct-coombs
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4975285/
Com carinho e dedicação,
Dra. Camila Thomazini
Doutora em Ciências Médicas
Hematologista e Patologista Clínica Veterinária